O
caipora e o marechal de papelão
Silvio Sousa
- O Senhor é um traidor!
- E o senhor é um marechal de papelão!
Esse
foi o último diálogo entre o marechal Deodoro da Fonseca e o professor Benjamin
Constant. Esses dois homens foram indispensáveis para que hoje dia 15 de novembro,
fosse comemorada a proclamação da republica, embora de fato, ela tenha
acontecido no dia 16. O livro 1889 de Laurentino Gomes mostra que com Deodoro o
destino foi enormemente generoso ao fazer dele o herói do movimento, mesmo
sendo um monarquista convicto. Já com Benjamin, um republicano declarado, o
destino foi cruel. O pai da republica é hoje um ilustre desconhecido dos
brasileiros.
Benjamin
foi quem disseminou as ideias republicanas entre os militares que se rebelaram
contra a monarquia. Mesmo sendo ídolo dos republicanos, Benjamin não tinha
patente a altura para liderar as tropas. É ai que entra a figura de Deodoro. O
velho e doente marechal aceitou comandar o levante porque, assim como a maioria
dos oficiais do exército, estava magoado e não suportava mais as humilhações e
o tratamento desrespeitoso dispensado aos militares pelos ministros civis do
imperador, em especial o ministro da Guerra, o Visconde de Ouro Preto.
Deodoro
dizia que a republica seria a tragédia do Brasil e que queria viver para
carregar o caixão do imperador Pedro II, por quem tinha respeito, admiração e
amizade. Por isso, ao liderar o movimento no dia 15, Deodoro depôs o conselho
de ministros, prendeu Ouro Preto e pediu que sua majestade o imperador nomeasse
um novo ministério. Ou seja: no que dependesse de Deodoro o Brasil continuaria a
ser uma monarquia.
Acontece
que no dia 16, um dia após o golpe, o imperador cometeu o erro de nomear o
senador Silveira Martins para chefiar o novo gabinete ministerial. Martins era o
rival número um de Deodoro, que entendeu a escolha como uma afronta. Aceitar a
nomeação de Silveira Martins seria a total desmoralização para Deodoro. Vaidoso
e ferido, o marechal então decidiu decretar a instalação de um governo
provisório chefiado por ele mesmo e dar 24 horas para que a família imperial
deixasse o país rumo ao exílio. A partir daquele momento o Brasil deixava de
ser império para se tornar o que hoje conhecemos como a República Federativa do
Brasil.
Sem Deodoro a
republica não aconteceria, mas ele virou herói por acaso. Estava no lugar certo
e na hora certa. Já Benjamin Constant não teve a mesma sorte. Depois daquela
discussão com Deodoro, pediu demissão do cargo de ministro que ocupava e morreu
dois anos depois, ficando como coadjuvante do movimento do qual foi
protagonista. Tamanha era a falta de sorte de Benjamin que em escritos pessoais
ele dizia ter caiporismo, o que na definição do folclorista Luiz da Câmara
Cascudo é um mal que torna as pessoas azarentas. Superstição ou não, é fato que
Benjamim teve muitos revezes na vida publica e pessoal e que apesar de ter dado
enorme contribuição na defesa dos ideais republicanos não teve o reconhecimento
pelo grande feito da republica. Talvez por azar, talvez por uma grande
injustiça dos homens de seu tempo e da história oficial.